Dejavú

Tromba d’água: Medeiros Neto revive drama que deixou cidade submersa há 53 anos

10/12/2021 - 12h09Por: Com informações do MedeirosNeto.com

Após exatos 53 anos, na mesma data de 8 de dezembro, os moradores de Medeiros Neto reviveram a enchente que causou um dos maiores prejuízos na história da cidade.

Em 1968, a tromba d’água deixou milhares de pessoas desabrigadas, houve prenúncio de mortes, fome e uma epidemia de febres infectocontagiosas, que atingiram a população. Hoje, em 2021 o desespero é revivido pela população, com prejuízo incalculável, devastação completa de casas residenciais e comerciais.

Em vídeo divulgado nas redes sociais, um morador do município mostra a devastação causada pela enchente e complementa: “Eu nunca vi uma coisa dessas, essa enchente aqui já teve em 68 e agora olha como é que tá”.

RELEMBRE O CASO

Na época, também houve inundação de toda a parte baixa da cidade pelas águas do rio Itanhém, tendo início às 20 horas de domingo, subitamente, esparramando as pessoas em suas casas que mal tiveram tempo  de sair correndo para as partes mais altas, vendo tudo que possuíam submergir das enchentes invasoras.

O rio Itanhém invadiu as ruas centrais de Medeiros Neto com tanta rapidez que muita gente escapou milagrosamente nadando ou subindo aos tetos de residências não totalmente cobertas pelas águas, onde passaram a noite inteira pedindo socorro, em dramática situação.

PREJUÍZO INCALCULÁVEL

Ao raiar da manhã de segunda-feira, o centro comercial e residencial de Medeiros Neto estava transformado em imenso lago, de onde mal se via as coberturas das casas que não foram totalmente tragadas pelas enchentes.

Pouco depois do rio ter transbordado, a ponte que liga uma extremidade da cidade à outra foi carregada pelas correntezas, enquanto os meios de comunicações locais foram destruídos pela inundação.

Milhares de desabrigados corriam em toda as direções, procurando refúgio nas igrejas, nos grupos escolares, nos ginásios, fugindo à sanha tromba d´água.

Desabrigados

Até hoje não se sabe quantos morreram na calamidade pública que afetou Medeiros Neto, mas é grande o número de pessoas que continuam desaparecidas após a trágica ocorrência.

Temia-se que uma onda de doenças contagiosas contaminasse toda a população de Medeiros Neto e urgentes providências já tinham sido tomadas para que isso não acontecesse.

Calcula-se em mais de 500 o número de casas destruídas  pelo rio Itanhém, num prejuízo que sobe a muitos bilhões de cruzeiros velhos, moeda na época.

SOCORROS CHEGAVAM DE NANUQUE


Os primeiros socorros para os flagelados de Medeiros Neto começaram a chegar de Nanuque/MG, onde o prefeito Geraldo Romano, acompanhado de ilustres autoridades, mobilizou uma campanha que contou com o apoio e a solidariedade dos nanuquenses, na aquisição de remédios, agasalhos e de dinheiro destinados às vítimas da tromba d´água.

A população aflita não teve nenhuma ajuda dos poderes estaduais e federais, embora o prefeito Jaime Ramalho Nóbrega já tivesse tomado todas as providência neste sentido, auxiliado pela Câmara Municipal de Vereadores.

Prefeito na época, Jaime Ramalho

Em 19/12/1968, O Estado de São Paulo, escreveu:

“Mais de 500 casas destruídas, 5 mil pessoas desabrigadas, serviços telefônicos e de urbanização danificados, lavouras devastadas e um número de mortos ainda não determinados – este e o balanço prévio da catástrofe que se abateu sobre o município baiano de Medeiros Neto (…)

Antigo Clube Social, onde acontecia os carnavais

(…) Medeiros Neto foi parcialmente destruída pelas águas do rio Itanhém, que subiram 6 metros acima de seu nível normal, em bora a cidade não tenha visto chuvas. Quando a região mineira do vale do Jequitinhonha foi inundada, o que ocorreu no último dia 8, a cidade sofreu os efeitos da tromba  d´água e, como o rio a divide em duas partes, a destruição alcançou grandes proporções.

Com o transbordamento do “Itanhém” 520 casas foram destruídas, inclusive edifícios públicos e lojas comerciais, deixando um terço da população ao desabrigo.Além de Medeiros Neto, também Alcobaça, na Bahia foi bastante atingida pela enchente, as duas cidades se localizam próximo a fronteira de Minas, na região do Vale do Jequitinhonha.

Avenida Óscar Cardoso

Sobre o rio Alcobaça, naqueles 2 municípios, existem 14 pontes destruídas e 120 casas derrubadas, o que representa um prejuízo de mais de 1 milhão de cruzeiros novos”.(O estado de São Paulo)

A sucursal de Belo Horizonte era quem passava as informações para os Jornais paulistas, por isso nestes há mais sobre às cidades mineiras e poucos detalhes dos municípios baianos. A situação de Medeiros Neto foi a que mais chamava a atenção quando se referiam a Bahia, sem dúvida devido à proporção dos danos causados.

Torre de comunicação

Seis dias antes , 12/12/1968,  outro jornal Paulista,  Folha de São Paulo, informava que a FAB ( força aérea Brasileira) socorria os  milhares desabrigados de Minas e Bahia.

“O serviço de busca e salvamento da FAB recebeu comunicado da secretaria de saúde de Minas informando que duas mil estão isoladas em Machacalis”.  (…)

Acrescentou o comunicado que a situação havia se agravado com a inundação da cidade de Medeiros Neto.

Sede da Prefeitura Municipal

“(…) subindo a mais de cinco mil as pessoas desabrigadas. As primeiras providências do socorro ás vítimas foram tomadas pela equipe de salvamento do SAR de Recife(…) que já montou um posto avançado em Caravelas, litoral baiano , de onde partirão as missões de socorros.) o objetivo e levar ás famílias remédios e os soros pedidos com urgência”. (Folha de São Paulo)

No dia 19/12/1968, o jornal O estado de São Paulo noticiava que a febre tifoide, doença infectocontagiosa causada pela ingestão de água contaminada, ameaçava as cidades atingidas.

“A febre tifoide constitui o novo e grave perigo que ameaça o Vale do Jequitinhonha, fato que a secretaria de Agricultura de Minas gerais já admitiu. O número de pessoas atacadas pela enfermidade aumenta em ritmo alarmante.

Cinquenta mil doses de vacina já se esgotaram (…) sobre os municípios baianos de Medeiros Neto e Alcobaça e Itanhém. Não há informações pormenorizadas relativamente à situação nesses municípios, tudo indicando que os prejuízos são vultosos, já que os rios Alcobaça e Itanhém alcançaram nível muito superior ao normal, em toda a região”.( O estado de São Paulo).

Prédio da atual padaria Só Pão

Segundo o jornal Correio da manhã de 12/12/1968, com estradas isoladas e plantações destruídas, a fome também perturbava o sono dos desabrigados, situação que levou algumas entidades providenciar doações. É digno de nota o fato de que a mobilização para ajudar as cidades atingidas, incluíram a cidade baiana de Medeiros Neto, como alvo da campanha.

“Os novos advogados pela faculdade Federal de direito (…) decidiram fazer uma campanha em favor das vítimas das enchentes daquela cidade, de Machacalis e de Medeiros Neto. A razão da campanha é que as populações estão sem ajuda dos órgãos governamentais. A fome alastrou a região e ameaça dizimar a população das três cidades.”(Correio da Manhã,1968)

Na Bahia a maioria da população vivia no campo, e o extremo sul ainda não tinha contato terrestre com a capital Salvador. Outro fato que chama atenção e a vulnerabilidade das cidades e dos pequenos agricultores ou pouseiros, facilmente acuados pela fome e doenças depois de um acontecimento inesperado.

Segundo Mello e Novais (1998), até meados dos anos de 1960 era essa a realidade do pouseiro e do pequeno proprietário : “bastava um ano de colheita ruim, porque choveu pouco, porque choveu demais, porque a seca veio braba (…) para romper aquele equilíbrio tão precário entre as necessidades vitais e a produção de alimentos.”

Agradecimentos: Daniel Rocha, Folha de Nanuque, Tozinho, Jorge Rex, Maria Luiza, Neto Rex

Fotos: Zé Rex (In memorian)

Redação Medeirosneto.com

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