Conteúdo

Bom de facão, bom de briga

24/07/2013 - 17h39Por:

Uma das figuras lendárias na história de Teixeira de Freitas é a de Manoel de Etelvina. Ele, descendente de colonheiros, comunidade de pequenos agricultores que sempre marcaram presença na história de nosso país. Nasceu ali, no Córrego da Tarifa, próximo ao Rancho Alegre.

Uma pesquisa, mesmo que superficial sobre a região em seu tempo vai mostrar um ambiente selvagem, duro, só afeito aos corajosos. Coragem era o que não lhe faltava. Isto ele tinha de sobra. O menino que cresceu no mato, tendo que enfrentar feras e intempéries, chegou à idade adulta com corpo rijo, mãos fortes, uma incrível resistência.

Manoel cresceu lá, dentro do mato. Mas queria conviver em ambiente mais “moderno” com gente à sua volta e espaço mais aberto. Estava cansado de passar as noites tendo como companhia só as cobras rasteiras, os bichos do mato e a sinfonia dos grilos.

Juntou as tralhas, algumas ferramentas, jogou tudo às costas e veio para o Comercinho da Mata. Era ainda de manhã. Aí pelas 9 horas já tinha percorrido todo o trecho. Percebeu um grande movimento de pessoas, que falavam muito sobre derrubadas de árvores e construção de serrarias. Viu um caminhão próximo a uma pequena clareira, já com dois toros de madeira. O nome era esquisito para se ler. “Berlier”. A parca leitura não lhe deu este prazer. E ele nem se importou.

Manoel falava um “caboclês”, de uma forma muito peculiar, bem diferente das outras pessoas. Isso não o impediu de perguntar onde tomaria um trago. Lhe informaram que era na barraca do Chico D’água. Como a maioria das madeiras ainda desciam pelo rio Itanhém, Chico D’água, excelente mergulhador, era quem ia lá no fundo buscar os toros mais rebeldes.

Quando não tinha trabalho ele abria a sua barraca, que vendia fumo de rolo, querosene, cachaça e torresmo. Dava pra ganhar uns trocados, mas seu comércio vivia mais fechado que aberto.

Pediu, tomou as providências e demarcou um espaço para seus projetos. Construiu barraco e passou a oferecer os apetrechos de Chico D’água, mais carne de porco fresca.

Ali começa a saga de Manoel de Etelvina, que passou à história como “bom de briga”. Teixeira de Freitas teve outros. O Albino, também um artista no manejo do facão. O Arlindo Pescador. E outros menos votados.

Wantuil de Freitas, meu consultor em histórias de brigas em Teixeira de Freitas, conta algumas histórias interessantes sobre Manoel de Etalvina e suas brigas. Sobre uma delas ele me contou assim: “A primeira briga que me lembro dele com um ajudante de carreta chamado Areis (Arésio ou Anésio) já falecido. Manoel de Etelvina se armou com um machado e seu oponente com o facão. E ele tinha fama de ser exímio no manejo do facão. A coisa foi ficando feia, porque o machado vinha forte e era mais pesado que o facão. Areis percebeu que a coisa ia ficando feia e começou a pedir socorro aos companheiros. E ele disseram: – “Corre Compadre!” Ele resolveu se mandar e pulou sobre uma tora de madeira. A mão de apoio  ficou para trás e lá vem o machado. A ferramenta pegou a ponta da mão e decepou um dedo. Areis nem olhou para trás e saiu em desambada.

Esta foi a primeira briga.  Outra foi de um desentendimento com um tal de Chicão e um amigo chamado João. Chicão estava bem à vontade dedilhando um violão que era da propriedade de Manoel. Aí, quebrou uma corda. Chicão era um cara direito e comentou o fato, dizendo que ia pagar o prejuízo. Manoel de Etelvina bateu o pé e disse que não queria o dinheiro, queria outra corda igual. Arranjar onde? Na região não tinha essas coisas.

Aí começou mais uma briga. Manoel partiu para pegar um facão e Chicão  sacou uma garrucha, uma dessas Flob ou beretta, de dois tiros. Apontou e atirou. A bala passou de raspão na orelha de Manoel. Manoel correu para dentro de casa e só se ouvia ele gritar: – “Solta eu muié, vô matar o Chico”. Aí começou a chegar a turma do “deixa disso”. Entre eles o  Chico D’água que era reconhecido como o segundo morador do lugar. Depois dele veio o Sr. Waldemar Batista com a família.

TIRA BANHA

Wantuil fala de outra briga, a que ocasionou o nome de Tira Banha durante algum tempo para o lugar. Muita gente pensa que foi Etelvina o ferido. Mas a história real é outra.  Assim ele conta:

“Ví mais uma briga. O Anísio  desta vez estava brigando com Manoel de Etelvina e  um tal de Delé, que também era chamado de Delisão. Na briga havia outro que não me recordo o nome. Anísio sacou de um punhal e feriu os três oponentes na barriga.  Depois de apunhalar os três sumiu entre a multidão do reisado. Os três, deitados pelos cantos, ficaram ali gemendo e gemeram a noite toda  enquanto as pessoas tentavam tomar alguma providencia. Só havia médico em Nanuque ou Caravelas. Em Duque de Caxias, onde haviam algumas casas, havia um caminhão velho. Mais ou menos as 10 horas do dia seguinte o caminhão chegou. Botaram os três na carroceria e  foram levados para Nanuque. Foram curados. Por causa deste episódio Teixeira foi chamada um tempo de Tira Banha”.

A região, ainda selvagem e com difícil acesso para as autoridades responsáveis pela segurança, abrigou muitas histórias assim. Aguardem. Contaremos mais.


Deixe seu comentário
Coluna
Fatos Históricos

Domingos Cajueiro Correia, de 65 anos, é o primeiro policial rodoviário a se formar no município. Ele faz parte de uma família que leva consigo a história de Teixeira de Freitas, desde quando era um pequeno povoado até a sua criação, e que contribuiu para o desenvolvimento do município. Hoje, além de atuar nas rodovias, ele dedica seu tempo para contar relatos narrados por seus familiares. Aproveitem este espaço que vai mostrar curiosidades que muitos teixeirenses desconhecem.

Veja mais textos